Em vez de escrever um artigo sobre o Mestre George Huebner prefiro publicar trecho de cartas por ele redigidas. Certamente ilustram muito melhor a personalidade esclarecida do homem.
“O Estado do Amazonas deterioram-se. A economia está completamente parada por causa da queda do preço da borracha. Imagine que em uma certa época a borracha custava 18.000 réis o quilo e que agora custa somente 1.600 réis!!!Hoje, Manaus está deserta, mesmo sendo a época da colheita da castanha-do-pará, cujo comércio atenua um pouco o prejuízo da borracha. Mas, em maio, a época das castanhas já estará longe, e só Deus sabe o que vai acontecer depois. Muitos comércios já fecharam, e muitos outros deverão fazer o mesmo dentro de pouco tempo. No interior, nas margens dos rios, a miséria gerou a anarquia. Os vapores e as lanchas que ali chegam são atacados pela população faminta. Se o governo federal não encontrar rapidamente meios para enfrentar uma tal calamidade, não sabemos o que será do Estado do Amazonas. Até agora, o governo não tomou nenhuma providência, e todos os apelos da nossa província ao Rio de Janeiro não obtiveram nenhuma resposta. É necessário, porém, que se faça alguma coisa, e, como o atual governo regional não tem confiança do Rio e é incapaz de enfrentar a situação, toda esperança se concentra em uma intervenção, único meio de salvação!”
—George Huebner, numa carta enviada ao Dr. Theodor Koch-Grünberg, em 15 de April de 1921.
Após a queda do comércio da borracha, Manaus não oferecia mais o luxo da “belle epoque”. Muitos abandonaram a cidade, mas esse não foi o caso do fotógrafo, que lançou-se no ramo da botânica. Daniel Schoepf fala de George Huebner como um ‘excluído da memória’, vítima tanto das vicissitudes quanto do desprezo do crédito fotográfico”.
Robério Braga – Secretário de Cultura do Amazonas
Georg Huebner (1862-1935). Auto-retrato, 1910.

Sobre a Expedição Roosevelt-Rondon
Mui venerado amigo, hoje, envio-lhe novamente dois recortes de jornais. Um dos artigos é interessante: o engenheiro Moerbeck tenta convencer os leitores que o rio da Dúvida, do qual a expedição de Roosevelt fez o reconhecimento e que a partir de agora passa a chamar-se de Rio Roosevelt, não era completamente desconhecido. Na verdade, não devemos dar a Moerbeck mais credito do que merece, pois é um bom orador. Mas pode ser que haja algo de verdadeiro no que diz!Você tem razão, a viagem de Roosevelt foi uma verdadeira peça montada à americana, e, se ele não tivesse o competente e respeitado coronel Cândido Rondón como acompanhante, sem dúvida não teria retornado vivo a Manaus. Rondón é um homem cheio de vida, muito simpático e um modelo a ser admirado pelos brasileiros. Deu uma gran bela prova de honradez recusando todos os presentes. Imagine: a Associação Comercial do Estado do Amazonas querendo oferecer-lhe um colar de brilhantes para a esposa, o que ele recusou com os agradecimentos habituais, argumentando que a esposa era uma caboclaHá o caboclo de terra firme, mais dedicado à caça e agricultura, ele conhece e se movimenta com agilidade na floresta densa das terras altas. Há o ribeirinho que habita as beiras de rio, mais dedicado à pescaria e aos cultivos de curto prazo acompanhando o fluxo das águas. Pele parda, fruto de séculos de miscigenação entre os índios nativos e muitos outros povos – principalmente brasileiros do Nordeste, portugueses, bolivianos, peruanos, colombianos, sírios, libaneses e judeus – pioneiros da época anterior ao ciclo da borracha ou que tomaram parte no boom. Com o tempo, os caboclos absorveram a sabedoria milenar derivada de muitas etnias indígenas. More e não usava essas coisas.
George Huebner, numa carta enviada ao dr. Theodor Koch-Grünberg, em 22 de maio de 1914.

Fotografia dos bastidores. Andaime sobre o rio Pachiteia, construído com o propósito de aprimorar o enquadramento da foto. Na imagem, Kroehle e Huebner, e, mais em baixo, o ribeirinho, provável construtor do andaime.
Fotografia de George Huebner (extraída do livro: George Huebner 1862-1935: um fotógrafo em Manaus, por Daniel Schoepf, editora Metalivros).
Admirável!
Andaime
A capa do livro, “George Huebner, um fotógrafo em Manaus”, mostra como o fotógrafo tinha um cuidado especial em seus enquadramentos. O simples artificio do andaime mostra uma dedicação não comum à imagem que está querendo produzir: ele já construiu o enquadramento em sua imaginação e então partiu para sua produção, a qual certamente levou no mínimo um meio dia para pôr em prática. Sua equipe de apoio foi na floresta, cortou as varas, levou à beira do rio e armou a estrutura. O andaime tem que estar muito bem feito para suportar os dois homens e reduzir ao mínimo os movimentos, pois as câmeras daquela época usavam tempos não tão rápidos como hoje.
A primeira vez que eu vi essa imagem senti aquele impulso criativo que o artista experimenta quando tem a visão da sua obra e procura os meio materiais de realizá-la. Lembrei de uma vez as inúmeras situações para ganhar um ponto de vista mais alto ou um ângulo que eu achava perfeito, mas de difícil alcance. O fotógrafo profissional lida com isso o tempo todo, mas o que maravilha mais de Huebner é que o uso dessa técnica é algo normal numa fase mais avançada da fotografia. Fotos antigas, em geral são similares em seus enquadramento e bem parecidas com as imagens de um amador. Em nossos dias, com a maturidade da arte fotográfica até o amador conquista o nível de avançado e pode fazer fotografias que são admirada tanto qual as de um profissional.
Isso significa uma qualidade indispensável na prática bem sucedida de qualquer produção artística: dedicação. Certamente Hubner era um fotógrafo com caraterísticas profissionais atuais.
Sobre os Waimiri-Atroari
“As notícias que têm chegado, de que os índios teriam atacado os coletores de borracha, matando três homens e ferindo gravemente dois outros, pegaram-nos de surpresa. Em reação, o governador deslocou para o local dois oficiais e cinquenta soldados. Que vão fazer lá? É realmente um absurdo! (…) Por hora, os índios ainda são os senhores do rio, mas quanto tempo ainda lhe resta antes que sejam deslocados pelos coletores de borracha? A Companhia Antunes adquiriu a concessão daquele rio com vista à exploração da borracha (…)A expedição punitiva voltou para Manaus depois de um mês com 19 Yauapery (atualmente conhecidos como Waimiri-Atroari) prisioneiros, entre eles uma mulher.(…) Pude tirar boas fotografias, se bem que com grande dificuldade. Como era de prever, alguns logo ficaram doentes devido à alimentação, com a qual não estavam habituados; inclusive, dois deles já faleceram. (…) Na verdade, não consigo entender com que finalidade ficam retidas aqui essas pessoas habituadas à vida na floresta.”
George Huebner, numa carta enviada ao dr. Theodor Koch-Grünberg, em 22 de maio de 1914.
Versão 0.1 – Texto não revisado, ainda
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